31. TESTEMUNHOS DA HISTÓRIA E RESISTÊNCIA

 

EDIÇÃO ESPECIAL DE TESTEMUNHOS DA HISTÓRIA

 

 HISTÓRIA E RESISTÊNCIA 

 

FLOR DO PÂNTANO, SÍMBOLO DE RESISTÊNCIA



Aprendi com Nelson Werneck Sodré a ver a escrita como uma forma de resistência intelectual. Partilho com vocês uma pequena cena narrada por ele para me explicar seu inabalável otimismo e a importância de manter o olhar voltado para os ideais humanitários mais elevados – simbolizados (na cena a seguir) pelas estrelas do céu. Ele tinha uma visão realista do mundo social, mas, ao mesmo tempo, idealista sobre a História como um processo rumo à realização desses ideais.  Esta postura lhe permitia resistir e enfrentar com firmeza as baixezas e sujeiras do lamaçal humano com o qual se confrontou em sua vida.

 

- Dois homens olhavam pela mesma janela – contou-me ele. Um deles fixava a atenção na paisagem em frente dele, onde via os porcos se chafurdando no lamaçal do chiqueiro. Ele construiu assim uma visão pessimista da humanidade. O outro mirava a beleza das estrelas no céu, via a grandeza do universo e era otimista quanto ao futuro.

 

Como a janela é a mesma e está aberta para as duas realidades, pode-se ver o lamaçal à luz das estrelas. Embora a lama esteja muitas vezes contaminada por materiais nocivos à saúde, ela pode também conter materiais orgânicos e inorgânicos, minerais e elementos usados para tratamentos. Existem flores de grande beleza – como, por exemplo, o lótus - que se desenvolvem na lama dos pântanos. Embora suas raízes cresçam nesta lama, as pétalas destas flores emergem sempre lindas.

A imagem das flores dos pântanos é usada para expressar a crença de que no meio do lodaçal humano pode surgir a vida e a beleza. As flores do pântano – em particular o lótus - têm um significado espiritual, mas aqui eu focalizo este símbolo em relação com a capacidade de resistência dessas flores. Durante a Segunda Guerra Mundial, ocorreu a ocupação alemã da França e a colaboração do governo francês com os ocupantes. Formou-se, então, uma rede subterrânea de combatentes. Ela era integrada por diversos movimentos sociais unidos e organizados com o objetivo de libertar o país. Tal rede ficou conhecida como a ‘Resistência Francesa’.

Ao atravessarmos o lamaçal que nos cerca atualmente é crucial estarmos em contato com a vida que pulsa no subterrâneo do lamaçal e pode ressurgir com todo esplendor, superando as mais obscuras e sombrias condições.  Os pântanos com suas águas paradas, lamacentas, levam à destruição e decomposição de plantas que não conseguem sobreviver neste meio adverso. No entanto, na lama podem também brotar belas e resistentes flores.

Em busca da luz, elas se elevam do fundo do lamaçal e despontam na superfície, vencendo as circunstâncias adversas. Elas se alimentam do fio da vida que permanece submerso e se desenrola nos mais inóspitos ambientes.  Na travessia sombria do pântano, precisamos da luz das estrelas que ilumina a escuridão para podermos distinguir os indícios da vida no contraditório processo da História.

Avançado nessa direção, anuncio-lhes uma iniciativa que procura manter acesa a chama da consciência, em meio às trevas da destruição e da morte que recobrem nosso presente momento histórico.



 

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